Aqui temos também aves a caírem, neste soneto do Sec. XVI, não por causa do frio, mas por causa do calor, numa estação que costuma ser fria.
Será que as mudanças climáticas só aconteceram agora e por nossa culpa? Leiamos!
O sol é grande, caem co’a calma as aves,
do tempo em tal sazão, que sói ser fria;
esta água que d’alto cai acordar-m’-ia
do sono não, mas de cuidados graves.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
qual é tal coração qu’em vós confia?
Passam os tempos vai dia trás dia,
incertos muito mais que ao vento as naves.
Eu vira já aqui sombras, vira flores,
vi tantas águas, vi tanta verdura,
as aves todas cantavam d’amores.
Tudo é seco e mudo; e, de mestura,
Também mudando-m’eu fiz doutras cores:
E tudo o mais renova, isto é sem cura!
Sá de Miranda
É um dos mais belos poemas do autor e, sem dúvida, o mais estranho. No Sec. XVI, o tema da mudança parecia tão moderno como nos parece hoje. Tudo muda, até mesmo o clima. Mas, em vez do nosso sentimento de culpa, exprime-se talvez uma sensação de impotência...
Mas, as aves cantando de amores, apesar de caírem, talvez nos passem despercebidas. Talvez porque o tempo delas não parece ser o nosso.
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